Comércio sem apoios efetivos à transformação digital

06 Out 2023

O comércio e os serviços de proximidade são indubitavelmente o setor que mais contribui para o emprego e criação de riqueza no país.

Marcado por negócios ágeis, mas de pequena dimensão, não tem o devido reconhecimento pela classe política, seja pela ausência de grandes players, seja pela falta de espírito associativo.

Porém, a sua importância para a economia, para as comunidades locais, para a regeneração e dinamização da vida urbana e/ou rural, é absolutamente crucial em Portugal, como em qualquer parte do mundo.

Este setor tem vindo a atravessar revoluções sucessivas que o obriga a adaptar-se e reinventar-se constantemente. A mais recente e provavelmente a mais complexa de todas é a da transformação digital.

A pequena dimensão dos operadores, leia-se fraca capacidade de investimento em processos de evolução tecnológica, associada à insuficiente capacitação digital dos empresários e dos seus quadros, torna este processo de transição verdadeiramente difícil. Mas não impossível, claro.

Em Portugal, à boleia do PRR – desenhado e pensado num contexto de pandemia para assegurar a resiliência e recuperação da economia durante e após aquele excecional período – o Governo promete promover a transição digital das empresas do setor com duas medidas que beneficiam de um envelope financeiro relativamente generoso: os “Bairros Comerciais Digitais”, com 52,5 milhões de euros, mais um previsível reforço de 25 milhões; e as “Aceleradoras de Comércio Digital”, com 55 milhões de euros.

Infelizmente, embora estes 132,5 milhões de euros estejam inscritos no eixo das Empresas do PRR, a verdade é que os investimentos promovidos pelas empresas na sua transformação digital não têm acesso a nenhuma destas medidas.

Os promotores das candidaturas dos Bairros Comerciais Digitais são as Câmaras Municipais e/ou as Associações Empresariais. Já as Aceleradoras são promovidas por estruturas associativas nacionais, regionais ou locais.

Sem querer beliscar o mérito dos programas, imagine-se que se quer melhorar a eficiência energética de um estabelecimento comercial e que os incentivos desenhados pelos Governo apenas apoiam os investimentos realizados na rua e que estes, no máximo, só podem ir até a porta do prédio. Ora, salvaguardando as devidas diferenças, é disto que se trata na digitalização do comércio.

O Governo quer apoiar a digitalização do setor, mas entrega a maior fatia do orçamento disponível às Câmaras Municipais para investimentos em hardware e software para o espaço público e o restante é reservado à criação de soluções coletivas de promoção digital (como marketplaces) e à realização de diagnósticos de maturidade digital, no caso das Aceleradoras de Comércio Digital.

Através destas medidas, o Governo prevê criar 95 Bairros Comerciais Digitais, que abrangerão mais de 25 mil estabelecimentos e criar 25 Aceleradoras de Comércio Digital que preveem apoiar 30 mil empresas, ou seja, em causa está a quantidade e não a qualidade das operações e, muito menos, o seu potencial de transformação.

Estou, por isso, convicto que 132,5 milhões de euros depois, o estado da arte pouco ou nada mudará.

A ansiada e prometida ‘transformação digital’, a acontecer, será por razões de mercado e pelo esforço e mérito dos empresários, porque os programas desenhados pelo Governo são claramente inconsequentes, caso não sejam complementados por um programa de apoio ao investimento das empresas – um programa de apoio ao investimento na modernização dos estabelecimentos comerciais e de serviços de proximidade, com ênfase nos investimentos em transformação digital, mas que também preveja investimentos na modernização física dos estabelecimentos.

Lembre-se que o último programa de apoio à modernização do comércio teve lugar há mais de uma década e que, no âmbito do PT2020 (e, infelizmente, espera-se igual dificuldade de enquadramento no PT 2030), estes projetos não tinham enquadramento previsto, ou seja, não tinham possibilidade de se candidatar.

Todavia, o Fundo de Modernização do Comércio continua a ser alimentado, ano após ano, com as receitas decorrentes dos licenciamentos de Centros Comerciais e Grandes Superfícies Especializadas e o Governo teima em não cumprir com a ideia base deste Fundo, que consiste em reverter as taxas arrecadadas com o licenciamento das grandes superfícies para a modernização do pequeno comércio.

Assim sendo, é necessário que o Governo promova a criação urgente de um programa de apoio à modernização do Comércio, assim como, preveja a criação de avisos de candidatura no âmbito do PT2030 desenhados especificamente para os desafios do comércio e serviços de proximidade.

O futuro não espera pelo comércio de proximidade. Mas o comércio de proximidade tem de se preparar rapidamente para assegurar o seu futuro.

É tempo, por isso, de se governar com responsabilidade e ambição, deixando de lado os preconceitos ideológicos com a iniciativa privada e aproveitar conveniente e eficazmente os fundos europeus que o país tem à disposição.

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