Artigo de opinião CCP | RFAI – Investimento Inicial

06 Mar 2025

Nos termos do artigo 22.º do Código Fiscal do Investimento, o RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.

Para o efeito, consideram-se aplicações relevantes os investimentos em ativos, desde que afetos à exploração da empresa, nomeadamente ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo e ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

Nos termos do n.º 5 do referido artigo, considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso, bem como os custos salariais incorridos com a criação dos postos de trabalho nos termos da alínea c) do n.º 2, aqui se incluindo o salário bruto antes de impostos, as contribuições obrigatórias para a segurança social, o seguro de acidentes de trabalho, os encargos com a guarda de crianças e ascendentes e outros encargos de origem legal ou decorrentes de regulamentação coletiva de trabalho.

Bom, aqui chegados, dir-se-ia que qualquer adição de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis poderia ser considerado um investimento realizado para efeitos do RFAI.

Mas o legislador não se ficou por aqui.

Considerou que o RFAI constitui um regime de auxílios com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno.

E, na sequência, publicou a Portaria 297/2015, de 21 de setembro, que procedeu à regulamentação de determinados aspetos do RFAI, nomeadamente com vista a assegurar a plena aplicação, neste âmbito, das regras decorrentes da legislação europeia em matéria de auxílios estatais, nomeadamente o RGIC, previsto no Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 16 de junho de 2014.

E, aqui começa o quebra-cabeças.

Ora, a referida Portaria considera que os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento (RFAI) apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com:

→ A criação de um novo estabelecimento,

→ O aumento da capacidade de um estabelecimento já existente,

→ A diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento,

→ Ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

Portanto, não basta a simples aquisição de ativos para que se esteja perante um investimento relevante para efeitos do RFAI. É necessário que preencha uma das referidas finalidades.

Ora, como a maior parte dos investimentos são feitos por empresas já existentes, em princípio, o investimento estará relacionado com o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente.

A administração fiscal tem vindo a fazer interpretações destes conceitos, que têm gerado liquidações adicionais de IRC, desconsiderando as deduções à coleta efetuadas no âmbito do RFAI.

Com efeito considera a administração fiscal que “para que se possa considerar existir um aumento da capacidade produtiva do estabelecimento, não basta que os investimentos permitam obter meros ganhos de eficiência, acréscimos de produtividade ou mesmo que possibilitem a redução de custos.

Para que se possa considerar que o investimento integra o conceito de investimento inicial, terá que conduzir a uma efetiva expansão da capacidade de produção instalada”.

Considera ainda, que “O facto de se ter verificado um aumento da produção não é, de per si, suficiente para que se considere ter ocorrido um aumento da capacidade do estabelecimento, sendo necessário que o investimento realizado conduza, como já referido, ao aumento da capacidade produtiva do estabelecimento (aumento da capacidade instalada). Tal diferenciação (entre produção e capacidade produtiva) é clara e determinante para o enquadramento do investimento descrito. Note-se que pode existir um aumento da produção, em determinado período, sem que a mesma ocorra em conexão com o aumento da capacidade produtiva do estabelecimento (capacidade instalada)”.

Por outro lado, parece que só o “primeiro” investimento é relevante (parece que cada contribuinte só pode fazer um investimento na sua vida), como é referido em informação vinculativa: “Esclarece-se, adicionalmente, que apenas estes moldes “iniciais” constantes do projeto de investimento serão elegíveis, não sendo de considerar futuras adaptações aos mesmos e/ou aquisição de novos moldes que se venham a mostrar necessários à posteriori, no decurso do processo produtivo, dado que, nesse caso, não integram o conceito de investimento inicial”.

No mesmo sentido, refere a administração fiscal que: “o investimento na aquisição dos “moldes” necessários à realização da atividade de exploração corrente da requerente, nos mesmos termos em que já vinha sendo exercida, não integra o conceito de investimento inicial e como tal, não poderá ser elegível para efeitos do benefício fiscal previstos nos art.º 23.º do CFI” O mesmo é dizer que não relevam os investimentos de substituição.

E, é necessário que se insira numa estratégia global de investimento (seja lá o que isso for), como decorre de outra informação vinculativa: “concluiu-se estar em causa a “aquisição isolada” de ativos conforme resultava da informação prestada pela entidade, que referiu que a aquisição dos ativos em causa não foi integrada em nenhum projeto de investimento. De facto, não obstante os investimentos em causa terem como objetivo comum o aumento da rentabilidade da empresa, o aumento da produtividade, redução do desperdício e modernização da empresa, entre outros, não se inseriram numa estratégia global de investimento com a finalidade de atingir o fim subjacente às tipologias do investimento indicadas: “aumento da capacidade de um estabelecimento já existente” ou ”diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, atenta a atividade desenvolvida pela entidade”.

Como o controlo das deduções à coleta relativas ao RFAI é, normalmente, feito no âmbito de procedimentos internos, não é difícil adivinhar que o resultado final é o da desconsideração das deduções à coleta, porque o contribuinte não demonstrou o aumento da capacidade instalada, porque não apresentou um critério tecnicamente sustentável para mensurar o aumento da capacidade instalada, porque se trata de um investimento de substituição, etc., etc.

Com efeito, de uma forma sistemática, a administração tributária considera que o conceito de “investimento inicial” só abrange as aquisições de ativos relacionadas com um investimento novo agregador que, de forma independente, se destaque em relação ao ativo pré-existente, encontrando-se, assim, excluídas do referido conceito:

→ A aquisição isolada de ativos,

→ A aquisição de “equipamentos de substituição” e de “equipamentos complementares”.

Em sentido contrário, considerou o CAAD no Processo n.º 483/2022-T, que: “não é de excluir deste conceito de «investimento inicial» o «investimento de substituição», pois, no que aqui interessa, se ele estiver relacionado com «aumento da capacidade de um estabelecimento existente» enquadra-se claramente no âmbito desta definição”.

A não exclusão do «investimento de substituição» destes conceitos é confirmada indiretamente no CFI pelo facto de ela estar expressamente prevista no seu artigo 11.º, n.º 4, para os benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo (BFCIP), mas não estar prevista para o RFAI ou para a DLRR, o que, no pressuposto de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como tem de se presumir (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil), permite concluir que não se pretendeu estender aquela exclusão ao RFAI e à DLRR.

Para além disso, as normas sobre benefícios fiscais integram-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, por força do preceituado nos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, pelo que é proibida pelo artigo 11.º, n.º 4, da LGT a integração de lacunas de regulamentação através de aplicação analógica, o que afasta a possibilidade de aventar quanto ao RFAI e à DLRR aquela regra especial do BFCIP.

De resto, as posições da Comissão Europeia que refere a Autoridade Tributária e Aduaneira, relativas à inelegibilidade de substituição de equipamentos para efeitos dos benefícios fiscais, veiculadas nas FAQs n.ºs 25 e 80 do «General Block Exemption Regulation (GBER) Frequently Asked Questions July 2015», reportam-se aos investimentos enquadráveis no conceito de «alteração fundamental do processo global de produção de um estabelecimento existente» e não ao conceito de «extensão da capacidade de um estabelecimento existente», a que se refere a FAQ 26.

Nesta FAQ 26, que se reporta, ao conceito de «extensão da capacidade de um estabelecimento existente» refere-se o seguinte:

26. O que se entende por “extensão da capacidade de um estabelecimento existente”? Isso deve ser entendido como a produção de um volume maior de todos os produtos?

A extensão da capacidade de um estabelecimento existente significa que o estabelecimento existente é colocado em uma situação em que pode fabricar mais volume de pelo menos um dos produtos já produzidos no estabelecimento, enquanto o processo de produção geral subjacente não é fundamentalmente alterado.

Como se vê, não há, quanto a este conceito de «extensão da capacidade de um estabelecimento existente», qualquer referência a afastamento dos equipamentos de substituição e, pelo contrário, incluem-se neste conceito todas as situações em que, com o equipamento adquirido, o estabelecimento passa a poder fabricar mais volume de pelo menos um dos produtos já produzidos no estabelecimento”.

Portanto, em caso de controlo de deduções à coleta no âmbito do RFAI, adivinha-se uma difícil tarefa de convencer a administração fiscal de que se trata de um investimento inicial, eventualmente, para extensão da capacidade de um estabelecimento já existente.

Por outras palavras, “empurram-se” os sujeitos passivos para contencioso desnecessário, com o desperdício de recursos que isso acarreta.

A sabedoria popular ensina-nos que se dá com uma mão o que se tira com a outra…!

 

Autoria: Gabinete Fiscal da CCP

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