Opinião CCP | “O novo regime de tributação das stock options”
04 Out 2024

A Lei n.º 21/2023, de 25 de maio, alterou, entre outros, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e o Estatuto dos Benefícios Fiscais, introduzindo um novo regime de tributação aplicável aos planos de atribuição de ações (“stock options”) constituídos por empresas que, nos termos da referida lei, qualifiquem como start-up, scaleup, micro, pequena, média empresa ou empresa de pequena-média capitalização ou, ainda, desenvolvam a sua atividade no âmbito da inovação.
Como se sabe, consideram-se rendimentos do trabalho para efeitos de IRS não só as remunerações pagas ou postas à disposição provenientes de trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado, como também as remunerações dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas e entidades equiparadas, com exceção dos que neles participem como revisores oficiais de contas.
E o conceito de rendimentos do trabalho compreende também as remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica, designadamente, no que ao caso importa:
“Os ganhos derivados de planos de opções, de subscrição, de atribuição ou outros de efeito equivalente, sobre valores mobiliários ou direitos equiparados, ainda que de natureza ideal, criados em benefício de trabalhadores ou membros de órgãos sociais, incluindo os resultantes da alienação ou liquidação financeira das opções ou direitos ou de renúncia onerosa ao seu exercício, a favor da entidade patronal ou de terceiros, e, bem assim, os resultantes da recompra por essa entidade, mas, em qualquer caso, apenas na parte em que a mesma se revista de carácter remuneratório, dos valores mobiliários ou direitos equiparados, mesmo que os ganhos apenas se materializem após a cessação da relação de trabalho ou de mandato social” (artigo 2º, nº 3, b), 7), do CIRS).
Vemos assim que a norma atinge os ganhos derivados de:
→ Planos de opções;
→ Planos de subscrição;
→ Planos de atribuição ou outros de efeito equivalente, contanto que os mesmos incidam sobre valores mobiliários ou direitos equiparados, podendo ter apenas natureza ideal.
Verificamos que a norma atinge ainda os ganhos resultantes de:
→ Alienação ou liquidação financeira daquelas opções ou direitos;
→ Renúncia onerosa ao seu exercício;
→ Resultantes da recompra por essa entidade, sempre que qualquer destes factos se revista de carácter remuneratório.
Finalmente, importa sublinhar que mesmo a circunstância de o beneficiário, já não ser trabalhador ou membro dos órgãos sociais, à data em que tais factos venham a ocorrer, não afasta a qualificação do respetivo ganho como rendimento do trabalho.
Definida a incidência, passemos à determinação do rendimento tributável. Disso trata o artigo 24.º do CIRS, nos termos que passamos a referir:
» Planos de opção ou de direitos de efeito equivalente
O rendimento considera-se obtido no momento do exercício da opção ou de direito de efeito equivalente e corresponde à diferença positiva entre o valor do bem ou direito nessa data e o preço de exercício da opção, ou do direito, acrescido este do que eventualmente haja sido pago pelo trabalhador ou membro de órgão social para aquisição da opção ou direito.
» Planos de subscrição ou do exercício de direito de efeito equivalente
O rendimento considera-se obtido no momento da subscrição ou do exercício de direito de efeito equivalente e corresponde à diferença positiva entre o preço de subscrição ou de exercício do direito de efeito equivalente para a generalidade dos subscritores ou dos titulares de tal direito, ou, na ausência de outros subscritores ou titulares, o valor de mercado, e aquele pelo qual o trabalhador ou membro de órgão social o exerce, acrescido do preço que eventualmente haja pago para aquisição do direito.
» Alienação ou liquidação financeira daquelas opções ou direitos
Neste caso o rendimento considera-se obtido no momento da alienação, da liquidação financeira ou da renúncia ao exercício, a favor da entidade patronal ou de terceiros, correspondendo à diferença positiva entre o preço ou o valor da vantagem económica recebidos e o que eventualmente haja sido pago pelo trabalhador ou membro de órgão social para aquisição das opções ou direitos.
» Recompra dos valores mobiliários ou direitos equiparados
Também neste caso, o rendimento verifica-se apenas no momento da recompra dos valores mobiliários ou direitos equiparados, pela entidade patronal, correspondendo à diferença positiva entre o preço ou o valor da vantagem económica recebidos e o respetivo valor de mercado, ou, caso aquele preço ou valor tenha sido previamente fixado, o quantitativo que tenha sido considerado como rendimento do trabalho aquando do exercício da opção, da subscrição ou da atribuição de valores mobiliários.
» Planos de atribuição de valores mobiliários ou direitos equiparados
Estes casos revestem-se de algumas especificidades, na medida em que os beneficiários podem ficar sujeitos a algumas restrições temporais quanto ao exercício dos direitos inerentes aos valores mobiliários ou direitos equiparados que recebem, o que determina o diferimento do momento em que o rendimento se considera obtido para efeitos de IRS.
Será o caso de planos de atribuição de valores mobiliários ou direitos equiparados em que se verifiquem pela entidade patronal, como condições cumulativas:
→ a não aquisição ou registo dos mesmos a favor dos trabalhadores ou membros de órgãos sociais;
→ a impossibilidade de estes celebrarem negócios de disposição ou oneração sobre aqueles;
→ a sujeição a um período de restrição que os exclua do plano em casos de cessação do vínculo ou mandato social, pelo menos nos casos de iniciativa com justa causa da entidade patronal; e
→ que se adquiram outros direitos inerentes à titularidade destes, como sejam o direito a rendimento ou de participação social.
Em tais casos, apenas quando os trabalhadores ou membros de órgãos sociais são plenamente investidos dos direitos inerentes àqueles valores ou direitos, em particular os de disposição ou oneração, é que se considera obtido o rendimento.
O ganho é dado pela diferença positiva entre o valor de mercado à data do final do período de restrição e o que eventualmente haja sido pago pelo trabalhador ou membro de órgão social para aquisição daqueles valores ou direitos.
Importa sublinhar que se considera entidade patronal, designadamente para estes efeitos, toda a que pague ou coloque à disposição remunerações que, nos termos deste artigo, constituam rendimentos de trabalho dependente, sendo a ela equiparada qualquer outra entidade que com ela esteja em relação de grupo, domínio ou simples participação, independentemente da respetiva localização geográfica.
A criação destes planos bem com a atribuição dos rendimentos referidos está sujeita ao cumprimento de um conjunto de obrigações declarativas.
Assim, por força do n.º 8 do artigo 119.º do CIRS, quando haja criação ou aplicação, em benefício de trabalhadores ou membros de órgãos sociais, de planos de opções, de subscrição, de atribuição ou outros de efeito equivalente, a entidade patronal é obrigada a declarar a existência dessa situação, cujo conhecimento se presume em todos os casos, através de modelo oficial, até 30 de junho do ano seguinte.
Por outro lado, as entidades que suportem os encargos, preços ou vantagens económicas relativas a planos de opções, de subscrição, de atribuição ou outros de efeito equivalente criados ou atribuídos, são obrigadas a:
→ Possuir registo atualizado das pessoas que auferem os correspondentes rendimentos, do qual constem o número fiscal e respetivo código, bem como as datas de exercício das opções, direitos de subscrição ou direitos de efeito equivalente, da alienação ou renúncia ao exercício ou da recompra, os valores, preços ou vantagens económicas tal como referidos no n.º 4 do artigo 24.º do CIRS;
→ Entregar aos sujeitos passivos, até 20 de janeiro de cada ano, cópia do registo referido na alínea anterior, na parte que lhes respeita;
→ Incluir nas DMR dos correlativos meses informação relativa aos valores mencionados na alínea a).
» A perspetiva particular para micro, pequena ou média empresa ou empresa de pequena-média capitalização e startups
Os ganhos acima referidos são, sem prejuízo da sua qualificação como rendimentos de trabalho dependente, ao abrigo do presente regime, considerados em 50 % do seu valor quando o plano seja atribuído por entidade que, no ano anterior à aprovação do plano, ou no ano de aprovação do plano caso este seja o primeiro ano de atividade da empresa, seja reconhecida como startup, nos termos do regime legal em vigor, e preencha pelo menos um dos seguintes requisitos:
→ Seja qualificada como micro, pequena ou média empresa ou como empresa de pequena-média capitalização, de acordo com os critérios previstos no anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro; ou
→ Desenvolva a sua atividade no âmbito da inovação, considerando-se como tal as entidades que tenham incorrido em despesas com investimento em investigação e desenvolvimento (I&D), patentes, desenhos ou modelos industriais ou programas de computador equivalentes a pelo menos 10 % dos seus gastos ou volume de negócios.
Consideram-se pequenas e médias empresa aquelas que tenham menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não excede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros.
Dentro destas poderemos ainda identificar as pequenas e as microempresas. Assim, consideram-se pequenas empresas aquelas que empregam menos de 50 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 10 milhões de euros. Por sua vez, são microempresas as que empregam menos de 10 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 2 milhões de euros.
Cabe sublinhar que, na determinação destes limites, no caso de micro/pequenas/médias empresas se entra em linha de conta com as «empresas associadas» e com as «empresas parceiras» tal como estas vêm definidas no citado Decreto-Lei, o que significa que, ainda que uma determinada empresa, isoladamente considerada, esteja dentro dos limites enunciados, poderá não qualificar como micro, pequena ou média empresa se ela for considerada «empresa associada» ou «empresa parceira».
Finalmente temos as empresas de pequena-média capitalização que são aquelas que, não sendo PME, empreguem menos de 500 pessoas.
Os referidos ganhos beneficiam ainda deste regime, se forem atribuídos por entidade que, no ano anterior à aprovação do plano, qualifique como micro, pequena ou média empresa ou como empresa de pequena-média capitalização, ou por empresa que desenvolva a sua atividade no âmbito da inovação.
Considera-se startup, a pessoa coletiva que preencha os requisitos cumulativos previstos no artigo 2.º da Lei n.º 21/2023, de 25 de maio.
Como se referiu o benefício fiscal consiste na tributação de apenas 50% do rendimento, mas pressupõe a manutenção dos direitos subjacentes aos títulos geradores dos ganhos ou dos direitos equivalentes, ainda que de natureza ideal, por um período mínimo de um ano.
Em tais circunstâncias, de acordo com o artigo 43.º-C do EBF, a tributação dos ganhos ocorrerá no primeiro dos seguintes momentos:
→ Alienação dos valores mobiliários ou direitos equiparados adquiridos por via do exercício da opção, sendo apurados pela diferença positiva entre o valor de realização e o preço de exercício da opção ou direito, acrescido do que haja sido pago para aquisição dessa opção ou direito.
Como vimos acima a tributação pode ocorrer em dois momentos: na data do exercício da opção e na data da alienação.
Ora, esta norma do artigo 43.º-C do EBF permitirá diferir ambas as tributações para o momento da alienação.
→ Perda da qualidade de residente em território português, reportando-se ao momento do exercício da opção ou direito, sendo apurados nos termos do n.º 4 do artigo 24.º do Código do IRS.
Neste caso, por força da perda da qualidade de residente tributa-se nessa data o ganho que possa ter ocorrido no momento do exercício da opção ou direito.
De referir que os rendimentos assim apurados, ficam parcialmente isentos de IRS até ao montante correspondente a 20 vezes o valor do indexante dos apoios sociais, sendo englobados para efeitos de determinação da taxa a aplicar aos restantes rendimentos.
→ Transmissão gratuita dos valores mobiliários ou direitos equiparados adquiridos por via do exercício ou subscrição da opção, ou do direito de efeito equivalente, sendo apurados pela diferença positiva entre o valor determinado nos termos do artigo 45.º do Código do IRS e o preço do exercício ou subscrição, acrescido do que eventualmente haja sido pago para a aquisição dessa opção ou direito.
Exceto no caso de startups ou micro ou pequenas empresas, o benefício fiscal não é aplicável a sujeitos passivos que detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20 % do capital social ou dos direitos de voto da entidade atribuidora do plano.
Estas ganhos, quando beneficiem do regime previsto no artigo 43.º-C do Estatuto dos Benefícios Fiscais, são tributados à taxa especial de 28%.